segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

nós

O apartamento que montei para os nossos encontros era assim: nas paredes, cópias de bom gosto, um Branque, um Rouault, dois Picasso, um Miró e um Modigliani. O chão todo forrado, em grafite, aparelhos de som, discos (eruditos modernos, popular francês, folclórico espanhol, cantochão). Uma estante com livros (poemas, Sade, alguns eróticos, livros de arte). Uma geladeira. Todas as bebidas existentes. Um gravador, tão sensível que podia até captar a batida dos nossos corações apaixonados e onde, enquanto um esperava a chegada do outro, gravávamos a saudade que sentíamos, a angústia da espera, o desejo que nos consumia; e onde ainda registrávamos o som que fazíamos e as palavras que dizíamos enquanto amávamos na cama e no chão e na banheira, com água quente, sendo continuamente renovada, estimulando e acalmando ao mesmo tempo. Ficávamos horas, na banheira, beijando um o corpo molhado do outro, o gosto da água nas bocas, inventando posições de retempero e deleite.

Rubem Fonseca, in: A Coleira do Cão / 64 Contos de Rubem Fonseca. Ed. Companhia das Letras

4 comentários:

  1. Aaaaaaaaaaaaaaaaah, q lindo!!!!

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  2. Majestosamente erotico!

    Me deleito com essas meias palavras..
    Minha casa, preparada para o meu bem, tem uma rede, uma garrafa de vinho tinto, alguns chocolates e algumas poesias...espaço de vigor, paixão e começo de desejo, o resto, não importa, detalhes nos escapam a vista depois do primeiro enlace.

    Um enorme beijo pra você querida menina-flor!

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