quarta-feira, 30 de outubro de 2013

para sempre, Ana C.

Hope Gangloff
Eu também, não resisto. Dans mon île, vendo a barca e as gaivotinhas passarem. Sua resposta vem de barca e passa por aqui, muito rara.
Quando tenho insônia me lembro sempre de uma gaffe e de um anúncio do museu: “to see all these works together is an experience not to be missed”. E eu nem nada. Fiz misérias nos caminhos do conhecer. Mas hoje estou doente de tanta estupidez porque espero ardentemente que alguma coisa... divina aconteça. F for fake. Os horóscopos também erram.

Me escreve mais, manda um postal do azul (eu não me espanto).
O lugar do passado? Na próxima te digo quem são os 3, mas os outros grandes... eu resisto.
Não fica aborrecida: beijo político nos lábios de cada amor que tenho.

Ana Cristina Cesar, in: A Teus Pés. Ed. Ática

segunda-feira, 28 de outubro de 2013

romance em doze linhas

Brian Rea, da série: Modern Love
quanto falta pra gente se ver hoje
quanto falta pra gente se ver logo
quanto falta pra gente se ver todo dia
quanto falta pra gente se ver pra sempre
quanto falta pra gente se ver dia sim dia não
quanto falta pra gente se ver às vezes
quanto falta pra gente se ver cada vez menos
quanto falta pra gente não querer se ver
quanto falta pra gente não querer se ver nunca mais
quanto falta pra gente se ver e fingir que não se viu
quanto falta pra gente se ver e não se reconhecer
quanto falta pra gente se ver e nem lembrar que um dia se conheceu.

Bruna Beber, in: Rua da padaria. Ed. Record

domingo, 27 de outubro de 2013

As sereias

Margarita Georgiadis
Atraídas e traídas
atraímos e traímos

Nossa tarefa: fecundar
atraindo
nossa tarefa: ultrapassar
traindo
o acontecer puro
que nos vive

Nosso crime: a palavra.
Nossa função: seduzir mundos.

Deixando a água original
cantamos
sufocando o espelho
do silêncio

Orides Fontela, in: Trevo, 1969-1988. São Paulo: Duas Cidades

Ode III

Il Deserto Rosso
Pouco é viver
mas pesa
como todo o ser
como toda a luz
como a concentração do tempo.

Orides Fontela, in: Transposição (1969) / Poesia Reunida. Ed. Cosac Naify

quarta-feira, 9 de outubro de 2013

maríntimo

Clara Joris - No me dejes sola en el fondo del mar
desde ontem – desde sempre
uma onda rebenta em meu peito
traz à tona o que vem lá do fundo
em forma de sonho e me tinge
de urgências

desde ontem – desde sempre

Líria Porto

sexta-feira, 4 de outubro de 2013

TIGRE SIBERIANO

Christer Strömholm, da série "Les Amies de Place Blanche"
adolescentes reproduzem meu fio condutor numa vasta cama de plumas & acessórios eróticos onde invisto minha língua sobre a previsão das mentiras para inventar um relato sobre sexo, ejaculações, coxas nuas que sobrepõem meus orifícios mediúnicos durante o coito & suas doses cavalares de memória em quartos escuros vistos sob o espaldar da cama que não range & que não prolifera nossas ardências na noite de frio, rumba, razão mimeografada presa à estante de brinquedos fabricados nos anos 90.

como se os meus olhos fossem o dorso de um cavalo prestes a mumificar a vida num galope sombrio, relincho tropical no alto da montanha ao invés de reconhecer o grito imaculado do homem que me domina sem o meu consentimento felino, pois quem enumerou os defeitos dos corpos teme o gesto de penetrar ou ser penetrado sem que os inimigos ou amantes sucumbam perante o último orgasmo travestido no sorriso de nossas gengivas, vaginas, líquidos empalidecidos enquanto o dia amanhece & tratamos de nos recompor: livre arbítrio que abre a boca antes que a presa se torne carcaça & eu psicografe o perigo do mundo. 

Antônio LaCarne